terça-feira, fevereiro 05, 2008

Fim

Acabo aqui.
Começo aqui:

Um Sonho que ainda Arde

sábado, novembro 17, 2007

Outono (Elegia ao declínio suave)

Pequenas palavras rasuram as gretas dos lábios pálidos, arroxeados da solidão que gela as árvores, os prédios e o Sol que se levanta sobre a manhã e os pássaros entorpecidos.
A brisa sangra por entre o fumo dos escapes e a névoa que serpenteia por entre as labaredas do lume tépido, libertando o odor reconfortante de castanhas sacrificadas nas cinzas como as folhas que se desfazem na berma dos passeios vergastados.

Tudo se cobre pelo véu do Outono moribundo, últimos estertores delirantes de uma estação condenada.

E o delírio é a calma.

Como se se abrisse uma espiral escavada até ao núcleo da Terra, se este não fosse uma amálgama ardente e viscosa mas um buraco negro, um vórtice que sugasse todo, completamente todo o equilíbrio dinâmico, energético e a animação existente à face rasgada no passeio dos Elementos.
Tudo cai naquele silêncio, no declínio suave e implacável que congela nas veias e condensa nas janelas, escorrendo em fieira das goteiras apodrecidas.

E também a fúria intempestiva.

Porque há vezes em que essa força jorra, brotando bruscamente da matriz fervente sobre a cidade em convulsões exasperadas:
Dilúvios de vento e neve, erupções que se espalham em ondas de choque e piroclastos e lava que batem e rebatem no espelho de nuvens, sonhos perdidos entre tornados e marés.

No entanto, qualquer seja a vida, qualquer que seja o espírito que toma conta da cidade, o prazer que corre pelas veias e formiga o corpo é o da recordação de um outro Outono, de uma outra calma entrecortada pela violência de desejos irreprimíveis

terça-feira, outubro 09, 2007

Silhuetas Incandescentes

São Sombras, senhor, são sombras.
Que saem do regaço da aurora e planam na brisa do tempo que passa pelo colo regado a giz e seda.

São sombras que trespassam o peito, como pombas em ramos ardidos.

E o corpo vagueia pelas calçadas – mãos manchadas de sangue e poeira , cotos mutilados fedendo em panos húmidos estendem-se esfomeados por entre as falhas do ar assobiante.
Rosas oxidadas desprendem-se das mãos flébeis, dançando por entre os interstícios de punhos e dedos sujos e esfarrapados. O sangue goteja da calçada à medida que os espinhos se enterram por entre os grãos até ao útero da cidade de fogo.

O caminho esvai-se de gente. O pão da cesta voa por entre as palmas dos pedintes como a brisa que antecede o furor do crepúsculo. Passos de cavalos retumbam por entre as paredes sangradas a cal:
Silhuetas recortando o carmesim da tarde. Jóias de chamas flutuando no amanhecer longínquo.
Porque o ferro forjado relampeja amaciado pelo fulgor da Estrela Vespertina ,enquanto se aproximam em ruídos metálicos e clangores atemorizantes.

Passo a passo.

São sombras, senhor, são sombras que revolvem o peito em vómitos secos e excruciantes.

Agigantam-se, cortantes e ameaçadores. E por entre o sangue escorrido do elmo e as folhas caídas da copa das árvores, perguntam:

“O que levas aí mulher?
Dentro da cesta, Por entre o regaço?”

“São sonhos, senhor são sonhos.
Sonhos e relâmpagos de água.”

sexta-feira, setembro 21, 2007

Crónica de uma Cidade Nua

No ar, um vago odor a cloro. Isso e o calor que se liberta do solo – rasgos que distorcem o ambiente numa ondulação imperceptível, ligeiramente intoxicante – induzem-me em percepções cambaleantes e timidamente surreais: uma melancolia que se apodera do corpo, como sementes que brotam em raízes que brotam em plantas que escorrem num líquido quente e viscoso que se enrola e se funde no fogo que corre na pele e no peito, rastejando e acariciando-me naquele vago aperto que enlaça a garganta e pressiona e chocalha.

Movo-me docemente pela cidade acabada de deitar.

Aqui e ali, vozes. O ocasional apagar de luz transforma-se numa melodia visual que acompanha o vaguear vacilante. Folhas e sacos de plástico voam tremulamente, embalados pelo vento que se enleia nas árvores dilaceradas; A luz alaranjada dos candeeiros ofusca as estrelas e rodeia-me numa sonolência tépida;

E a mente volta-se para dentro, enquanto os olhos absorvem aquilo que os rodeia.

O troar distante dos carros, convertido num gemido gélido, aumenta de intensidade enquanto me aproximo da avenida principal. Não passam muitos, e, por instantes, apenas se sabe os gemidos do alcatrão moribundo:
Réstias que se escapam da teia que o vidro teceu.

O trinco solta-se com um estampido tranquilizante, cortando o ar numa fuga apressada:
Luz que se refracta, barreira invisível entre o vento e a brisa.

Entrei.

Continuei num estado hedonisticamente divagante, o espírito forçando-se para fora de um corpo quase autómato sob o brilho vigilante das lâmpadas de halogéneo.
E o som insistente do elevador permeou a escrita que nascia cadente; êxtase suave, como os sonhos que alimentam o sono dos justos.

terça-feira, setembro 04, 2007

Ciclos

Sulcos de fogo jazem sobre a carne queimada.

Pedaços de sonhos carbonizados derramando-se por entre os vales foliculares, em espasmos e urgências gorgolejantes ;
O miasma quente verte para o pó esvoaçante em fluxos marciais, apertos parasíticos que abraçam a melancolia da terra rija e cauterizada .

Rabiscos momentâneos esculpidos no vento: estertores de sombras de sonhos mortos.

Labaredas volteiam e revolvem a terra martirizada: dentes que brilham em clamores asfixiantes, línguas húmidas que pingam ácido.
Brilhos cáusticos e aquosos que se camuflam em relances cortantes, bruxuleando incertos no contraste entre o fogo e a noite, desfazem o solo claro em orgasmos chicoteantes e vómitos purgativos.
E o som dorme entre os montículos de cinza, embalado pela catarse das chamas.

O fogo extingue-se, semente hibernando no solo e palpitando no útero da respiração pulsante.
Chovem melodias esfuziantes, que acordam o que lateja no interior da Terra.
E toda Ela treme, na ânsia da esperada ressurreição...
E os sonhos irrompem como plantas:
Quebram secamente o miasma mole, que sucumbe por entre as gotas de chuva;Os gritos são absorvidos pela música que se funde no ambiente.

Todos os sonhos são esperanças, e todas as esperanças são eternas.

segunda-feira, agosto 13, 2007

Orvalho Auroreal

E o pó esvoaça sobre o solo, desenhando esboços suaves de sonhos perdidos. Pequenos falhanços enclausurados em falas esquecidas que se ligam ao vento.
E o fumo abismal que se espalha pelo sons repercutidos em esboços secos, levados na emoção de asas claudicantes que se derramam (como a água que foge do cerco estelar que vela e queima) pela terra sequiosa.
E a lua, lívida do cansaço tresmalhado de vaguear por entre os astros de outros reinos, chora, em cristal, as linhas que se desenham nos estuários de terra.
Porque as palavras perdidas, foi ela que as lançou à luz e às ondas, infatigáveis viajantes nas auroras boreais.


Espectadores melancólicos e intermitentes:

Amiúde, esquecemo-nos de como se caminha.

Amiúde, esquecemo-nos de divagar.

segunda-feira, julho 30, 2007

E a noite cai sobre os corpos

São correntes de luz doirada que me saltam do peito em trepidações ténues. Jorros de espírito e sombra estendem-se pela página branca em serpenteares lisos e ritmados, formando palavras que ninguém vê – Langores de deuses renascidos em brumas.
Escondem-se por detrás dos textos, das linhas uniformizadas e monótonas, assombrando quem lê e quem escreve em pesadelos mansos e deliciosos – Força e solidão espectral.

Porque todas as cores do arco-íris são a Luz branca que cria o Fogo.

Pequenas ondas convulsivas estendem-se pelo ar em volta, electrões chocando em estrelas chocando em asas, numa hipnose limiar.... Saltam entre dimensões e realidades, acariciando todos os sentidos da psique humana, desafiando-a em jogos estranhamente eróticos e espirituais.
Porque tudo isto é um mergulho na mente de um homem. Tudo isto é um êxtase confessional.